Porque escrevem as pessoas?
Já me fiz tantas vezes esta pergunta que hoje posso respondê-la com a maior facilidade.
Elas escrevem para criar um mundo no qual possam viver.
Nunca consegui viver nos mundos que me foram oferecidos: o dos meus pais, o mundo da guerra, o da política.
Tive de criar o meu, como se cria um determinado clima, um país, uma atmosfera onde eu pudesse respirar,
dominar e recriar-me a cada vez que a vida me destruísse.
Esta é a razão de toda obra de arte.
Só o artista sabe que o mundo é uma criação subjectiva, que é preciso escolher, seleccionar.
A obra é a concretização, a encarnação do seu mundo interior.
Ele espera impor a sua visão pessoal, partilhá-la com os outros.
Se não atinge esta última finalidade, o verdadeiro artista persiste assim mesmo.
Os poucos momentos de comunhão com o mundo valem esse sofrimento, pois finalmente esse mundo foi criado
para os outros como um legado, como um dom a eles destinado.
Também escrevemos para aprofundar o nosso conhecimento da vida.
Para atrair, encantar e consolar.
Escrevemos para acalentar os nossos amantes.
Para degustar em dobro a vida: no momento preciso e retrospectivamente, na sua lembrança.
Escrevemos, como Proust, para tornar as coisas eternas e para nos convencermos de que elas o são.
Para podermos transcender a nossa vida e alcançarmos o que existe além dela.
Escrevemos para aprender a falar com os outros, para testemunhar nossa viagem ao labirinto.
Para abrir, expandir nosso mundo quando nos sentimos sufocados, oprimidos ou abandonados.
Escrevemos como os pássaros cantam, como os primitivos dançam os seus rituais.
Se não respirar quando escreve, não gritar, não cantar, então não escreva porque a sua literatura será inútil.
Quando não escrevo, o meu universo reduz-se; sinto-me numa prisão.
Perco a minha chama, as minhas cores.
Escrever deve ser uma necessidade, como o mar precisa das tempestades – é a isto que eu chamo de respirar.
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